(re)nascimento

07/10/2017

Dia 07 de outubro de 2016, estamos no mês de conscientização a respeito do câncer de mama e hoje fazem 9 meses que fui operada e dei início ao tratamento propriamente dito. E é também quando acabo de finalizar as sessões de radioterapia, após ter feito as de quimio. O tratamento segue, o monitoramento é para sempre, mas hoje considero passada a fase mais crítica do processo. E me considero curada.
Fui diagnosticada aos 31 anos de idade, relativamente jovem, tendo em vista que o exame mais empregado para detectar essa doença, a mamografia, é exigido no geral a mulheres a partir dos 40 anos.
Ativa, no peso, não fumo, não bebo, vegetariana, feliz. Esse é meu perfil, resumidamente, cujas características não condizem com aquelas consideradas propensas ao desencadeamento da doença. Não estava nos planos desenvolver câncer, até pouquíssimo tempo atrás eu mal sabia detalhes a respeito, só muito superficialmente. Mas aconteceu. Acontece.
Desde então vivo a fase mais delicada e mais transformadora da minha vida. A que exigiu os maiores cuidados, e na qual me deparei com todas as minhas fragilidades mas também com a minha potência. E fico muito contente por ter tido o discernimento de, rapidamente, fazer uma opção por jogar a meu favor, encarar da melhor forma os acometimentos decorrentes, com positividade e aceitação. Sou uma otimista incurável, isso sim.
Mais do que entender as razões, busco dar um sentido. São tantas as hipóteses e pretensas justificativas do por que isso acontece com determinadas pessoas, que penso que não vale a reflexão. Sabendo de que nunca terei uma resposta precisa, não fico fazendo a pergunta. Minhas energias são todas direcionadas para o meu bem-estar, e esse seria um conselho que daria se alguém me pedisse. É importantíssimo aprender a administrar o sofrimento, e essa lição vale para todos.
Caso pudesse ter optado jamais escolheria passar por isso, obviamente, mas peguei pra mim assim que soube, e fiz disso meu “turning point”. Com toda angústia, insegurança, ansiedade e medo que vem no pacote. E acho que me saí bem. É o tipo de situação arrebatadora da qual não se pode fugir, não dá pra negligenciar por que é das mais complexas, mas fica a critério o como se relacionar com isso. E eu não tenho vocação pra derrota. E nem pra revolta. Agradeci desde o primeiro momento, ainda que resignada.
Em decorrência disso tenho exercitado diariamente os sentimentos e condutas mais nobres tal como paciência, fé, gratidão, paz, amor, compreensão, fortaleza, e tantos outros. E o mais significativo deles, a resiliência. Sinto-me uma privilegiada pois desde o primeiro momento contei com uma rede de pessoas fantásticas me amparando, e a essas devo tanto. Devo tudo. Família, amigos, desconhecidos (que passei a conhecer e a amar com toda força), tanta gente de bem veio pra junto de mim. Emociona. E é por essa e outras que só consigo encarar como uma oportunidade o que tem me acontecido, por que por mais que eu lamente e lide com as consequências, é o tipo de situação que traz a gente “pro jogo”, postura que muitas vezes adiamos vida afora.
Que “a vida só acontece fora da zona de conforto”, como ouvimos dizer, mas é tão difícil de incorporarmos. E constatando ainda outros clichés literalmente na pele, como “a gente só sabe da força que tem quando a única alternativa é ser forte”, e o mais importante deles, “só o que permanece é a impermanência”. Não existem garantias. Portanto não espere a situação ideal para ser feliz, a dor é inerente à vida, mas sofrimento pode ser relativizado.
Assim, o que fica pra mim é que por vezes não dá para prever, nem sempre dá para se prevenir, mas dá para tomar um partido: o seu. Se cuide, se conheça, se respeite, se valorize, se ame, seja em outubro, seja quando for, seja para tentar evitar ou mesmo lidar da melhor maneira com um câncer, seja em qualquer circunstância. Por que comigo aconteceu isso, mas cada um sabe das batalhas que trava, e todos travam. Mas, para além delas, siga, e vai confiante, por que a diferença que você faz na sua vida é total. E ciente de que só o que efetivamente temos é a nossa vida, o resto todo é emprestado, o resto todo compõe o reino das infinitas possibilidades. E isso nos ultrapassa.
Simbolicamente, nove meses depois do dia que considerei o mais triste da minha vida nasce uma outra Marina, que se sente tão abençoada e espera, de coração, poder retribuir a Deus e ao Universo tanta generosidade, ainda que com o gesto singelo de buscar dar um testemunho que inspire. Marina que morre e renasce a cada momento, e segue dançando ao ritmo próprio da vida, que é instável, e que ela tanto ama.