Limites.


06/01/2018

2 anos do dia em que mais senti medo na vida. Aquela coisa de que quando tá bom passa rápido e a gente nem vê, mas quando tá ruim, ruim mesmo, parece que não vai passar nunca. E era como se aquela dor nunca fosse passar, tamanha. Parecia que eu não resistiria aos minutos seguintes, que eu iria ruir naquele instante, a cada instante.
Apesar de todo suporte, de estar sendo bem assistida, de ter o amparo de pessoas queridas e uma família maravilhosa como base, é o tipo de situação em que você se depara consigo mesmo na mais completa introspecção. Tá lá você para lidar, ao fim das contas, com todas as suas sombras, a insegurança, desolação, angústia e sofrimento. Não há nada mais a ser feito além do que deve ser feito, nem correr, nem esbravejar, nem negligenciar ou dissimular. Só prosseguir, e o como cabe somente a nós, tentar passar pela tormenta com alguma lucidez ou perder efetivamente o controle. Confesso que quase o perdi por alguns momentos.
Viver na pele o que dizem, de que “coragem é ir com medo”. Eu só fui, munida de toda esperança e fé que eu pudesse sentir, mas em pânico. Não deu para dormir a noite toda, pesadelos, tremores, dor. Afinal, no dia seguinte logo bem cedo eu entraria no centro cirúrgico para nunca mais ser a mesma, mesmo. Que a gente muda a cada dia, sabemos, mas tão drasticamente... nem sempre. É quando passamos por algo tão crítico assim que a gente se transforma, o corpo e a alma, inevitavelmente.
Mesmo após dois anos, e felizmente tendo as coisas saído como o previsto (curada!), escrevendo sobre eu sinto ainda uma agonia intensa, revivida. E acho que é isso que me move a escrever eventualmente sobre o que foi a experiência do câncer na minha vida, para tentar ressignificá-la, fazer com que me assombre menos. Sabe, não dá pra ficar repassando toda hora na memória o que foi aquele dia, nem os dias prévios e posteriores, evito. Parece até que eu esqueci alguns detalhes, o que acho bom, a mente é sábia, apagou parte. Tá inscrito só lá, no inconsciente, de onde nunca se apaga.  
Mas também me predisponho a falar sobre por que acho que a gente muda a forma de como nos relacionarmos uns com os outros quando expomos nossa vulnerabilidade. Eu realmente acho importante saber o dia em que eu mais senti medo na vida. Eu quero me conhecer, saber dos meus limites, e eu sobrevivi a esse estado de tristeza profunda. Eu clamei pelo que de mais sagrado existe em mim, eu reconheci minha pequenez diante do todo, e me amparei eu mesma, eu confiei. E, depois daquilo, muito do que fazia sofrer hoje é insignificante. Não desejo essa sensação a ninguém, mas agradeço por quem passei a ser a partir dela.

(Essa de costas no palco sou eu dançando dia 10 de dezembro passado, algo que amo fazer e que, mais do que nunca, faz com que eu me sinta viva.)